domingo, 23 de agosto de 2020

A NOSSA LIXA

 

21/06/2020

Tive o privilégio de ler um poema na comemoração simbólica dos 25 anos da Lixa como cidade. Tinha intitulado esse poema como " a minha Lixa", mas depois percebi que não faria sentido, pois se há partes do poema que são muito pessoais, outras (que são muitas) partilho-as com todos os que têm raízes aqui. Então aqui fica a " Nossa Lixa", para todos os Lixenses, e para todas as pessoas que já foram ou que são felizes na Lixa.


Quarta feira e dia de teste
Na C+S da minha terra
Escola de cheiro a nova, a estrear, que investe
Nos catraios daquela primavera

E nessa primavera já Verão, 21 de junho
Estava sentada a fazer o teste de inglês
E no meio do meu English em gatafunho
Um coletivo “viva à Lixa” em Português!

Os foguetes anunciavam a vitória
E com doze anos percebíamos a glória
Lixenses orgulhosos gritávamos com vaidade
“A Lixa é cidade”, “A Lixa é cidade”

Saltavamos e gritávamos, um rebuliço
Os espertalhões aproveitavam para copiar
Nunca, em nenhuma avaliação se viu isso
Em mais nenhuma se voltou a dar

Vinte e cinco primaveras depois, mais um dia de verão
Hoje não gritarei ou saltarei, na verdade
Pula e grita antes por dentro e em paixão
A Lixa dos lixenses, raiz de identidade

E o que salta por dentro é maduro e verdadeiro:
É o sotaque, o chão, as tradições e o cheiro
E o que grita em silêncio, genuíno e puro:
A vizinhança, amigos, família, o porto seguro

A Lixa dos lixenses, a cidade
Que nos traz um chão de identidade
A Lixa que vibra ao som eufórico
Da banda de música, do rancho folclórico

A Lixa pintada do cimo do Ladário
Outrora da vitória dos liberais cenário.
A Lixa de Cerqueira Magro e de Eduardo Freitas,
Do comboio Joaninha de linhas desfeitas

No Seixoso gritam histórias em silêncio
E brota a água pura da fonte de Juvêncio
A Lixa da Nossa Senhora das Vitórias
Lixa de devoção, ajoelhada em memórias

A Lixa da Comenda da Ordem de Cristo,
Das pedras que cantam o que já não é visto
A Lixa da capela de Santo António e do Paço de Borba
Dos Bombeiros Voluntários, com coragem de sobra

A Lixa é música de Teixeira Douro, regida
A Lixa é a fé do Padre Durães, acolhida
A Lixa é a poesia de António Nobre, a doer
A Lixa é a filosofia de Leonardo Coimbra, obreiro a fazer

A Lixa é o seu jornal e o seu futebol
É o povo a falar na rua em dias de sol
A Lixa são os escuteiros de Santão
A percorrer na terra verde, cada pedaço de chão

A Lixa é brindarmos com vinho verde
O vinho que é nosso e que mata a sede
E dentro de casa na lixa plantada
Dormimos envoltos na cama bordada.

TREPADEIRA DE LUZ

 

09/06/2020

Num passeio por um campo de quivis, explicas-me que não o são... tratam-se afinal de pés de feijão... é tão óbvio que aquela folhagem para ti alta e densa esconderá algo maravilhoso... uma aventura mágica! Talvez um gigante ou um passarinho... talvez uma pedrinha colorida... qualquer uma das hipóteses seria fascinante. Trepas para o meu colo como uma trepadeira pelo muro ou como o João pelo pé de feijão mágico. Quando chegas ao meu colo, o teu sorriso de luz acende assinalando a chegada ao destino, que era tão simplesmente o meu. Afinal de contas, não foste tu quem chegou à minha altura... fui eu quem chegou à tua, e sem sair do lugar, na tua subida, pude ver um maravilhoso campo cheio de pés de feijão mágicos que nos envolvia.

HAJA UM POUCO DE AMOR

 

28/05/2020

Este poema surgiu da angústia social que em maior ou menor escala, por diferentes motivos e perspectivas,a todos assombra. Haver um pouco de amor, pode fazer a diferença: numa caixa solidária, no voluntariado, ajudando um vizinho, usando uma máscara para proteger o próximo. A preocupação e o respeito pelo outro poderão tornar o solo menos árido...
Depois, este meu poema tornou-se letra, de uma maravilhosa composição dos Há Lá Trio.
Hoje dou-vos a conhecer o poema/ letra. Um dia destes os Há La Trio mostrar-vos-ao o resto...
Dum lado a peste e do outro a fome
Grita em tom agreste o silêncio que dorme
Em quatro paredes e uma porta fechada
Falta na dispensa o fruto da enxada
Talha-se o medo com cores e a frase batida
Enquanto se procura e não se acha a saída
Fraco remédio para as vidas perdidas
Mesinhas inúteis para as fomes sentidas
Dum lado a fome e do outro a peste
Ganha o ter de ser e a coragem que resta
Abre então a porta a alma abandonada
Sobrevive no limite da cova da enxada
Talha-se o medo com cores e a frase batida
Que crianças pintam na esperança sofrida
Adivinha-se a história pela história marcada
De sombras incertas entre a guerra e o nada
O sol quando nasce já não brilha pra todos
Levantam-se paredes mergulhadas em lodos
Rosa dos ventos em pontos de vidraças
Quem consegue sair da sua carapaça?
Há um silêncio em cada casa escondida
Onde falta sol, espaço, saúde e comida
Troca-se a comida por poder respirar
Aprende-se a viver só com um pouco de ar
Entre a fome e a peste, haja um pouco de amor
Para semearmos nas pedras um mundo melhor...

sábado, 22 de agosto de 2020

REVOLUÇÃO DAS MÁSCARAS

02/05/2020

A minha espingarda é a minha voz. Quero ferir de atenção as pessoas, para evitar que se magoem. Quero travar a liberdade das pessoas no gatilho que se disparado, perfuraria a liberdade dos outros. Na minha voz há responsabilidade e responsabilização. Há uma máscara colocada no meu rosto para garantir que todos possam trabalhar e viver, sem ser eu a provocar-lhes algum mal. A minha voz e a minha respiração trespassam a minha máscara com algum desconforto, com dor nas orelhas... mas nunca a tiro. Que desconforto ridículo, incomparável ao dever cívico de fazer algo por um bem maior. Eu “não ando mascarada”, eu ando como deve andar quem respeita e dá importância máxima à vida e ao trabalho do próximo e que quer contribuir para uma nova normalidade, o mais depressa possível - com uma máscara no rosto.

A minha voz é a minha espingarda e na minha espingarda coloco uma máscara. A minha espingarda tem uma máscara para te proteger. Porque a minha máscara protege-te e se usares uma, a tua protege-me. Não queres colocar também uma máscara na tua espingarda para me protegeres?

As flores? Essas também estão sempre comigo... trago-as ao peito.

PAIXÃO

11/04/2020

Num caminho sem qualquer caminho, abarcar o sofrimento que consome o corpo ao arder na alma. Exasperar por coroas de espinhos que sangram a natureza humana. Num caminho sem qualquer caminho, seguir na solidão a missão de salvar os pecados do mundo.

Desesperar de dor, a cada golpe infligido no calvário, pela redenção invisível.

Num caminho sem qualquer caminho, o maior caminho do mundo - o da vida pela Paixão e o da Paixão por todas as vidas.

Uma Paixão feita em sofrimento, de nós e por nós.

E nós? Que fazemos nós todos os dias com essa Paixão?... nós... continuamos a fazer o que melhor sabemos - coroas de espinhos.

DESMASCARAR

 

06/04/2020

A liderança estava mascarada
Tinha um sorriso no rosto
Dizia “isto não vai ser nada,
Nada de alertar para o oposto”

O egoista estava mascarado
E de si pra sua Primavera:
“Os velhos que tenham seu fado,
O meu sol na rua me espera”

A sociedade estava mascarada
Mas a suar ignorância e futilidade
De senso crítico tão desarmada
Vai perdendo aos poucos a liberdade

O velho estava mascarado
A teimosia tirou-lhe o ar
Morreu sem fôlego , abandonado
Sem a família o poder abraçar

O jovem estava mascarado,
E disseminou infortúnio penoso
Desertor do combate no sofá sentado
Terminou no hospital ao lado do idoso

O medo estava mascarado
Dizia “vai ficar tudo bem “
As mortes, o desemprego ignorado
O tempo difícil que aí vem

A insanidade estava mascarada
Perante os soldados bem protegidos
“Até porque afinal não falta nada”
Só armas, balas e a farda já pedidos

A mentira estava mascarada
De “não ser preciso se mascarar”
É só outra mentira descarada
Tudo vale para o povo “não alarmar”

A tua essência é desmascarada
Face ao dever e responsabilidade
Em desígnios terrenos, na ponta da espada
Só vamos vencer enfrentando a verdade

sábado, 1 de fevereiro de 2020

THE OAK



#oaktrio #casadasartesdefelgueiras#viagemmaravilhosapelaflorestamusical #obrigadaoaktrio


Quercus em ecos de mim...
Abrem-se as portas do sagrado
No seu tronco largo abraçado
Por divindades e por mim
Crescem suas raízes milenares
Ancorando-se em vastos lugares
No chão que me cobrirá no fim
Quercus em ecos de mim....
Que venha dura a tempestade
Um céu cheio de adversidade
Ímans de fogo do cume ao sopé
E dentre os raios flamejantes
Sair provavelmente triunfante
Mas se morrer... morrer de pé!
Quercus em ecos de mim...
Soberano no meio da floresta
Dar guarida em uma qualquer fresta
Aos animais que procuram seu fruto
E ser assim, abrigo e alimento
Até que um lenhador, num momento
De machado na mão acabe com tudo!
Quercus em ecos de mim...
Ser depois casco para envelhecer
O vinho do Porto que hão de beber
Um trago a ti nessa festa!
E seres quatro tábuas de madeira pregada
Quando um corpo já não vale nada
Dormindo contigo a eterna sesta.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

NOVOS LOUCOS ANOS VINTE

 

Teremos chegado aos loucos anos vinte de um novo século. 
Loucos pela falta de empenho e desempenho. 
Loucos pela falta de determinação e afirmação. 
Loucos pela hipérbole da futilidade.
Loucos pela crença na pseudociência.
Loucos pelo desuso do raciocínio.
Loucos porque os valores mais nobres são desvalorizados.
Loucos porque parece que o crime compensa.
Loucos porque  não nos olhamos nos olhos.
Loucos porque não nos questionamos.
Loucos porque não queremos saber.
Loucos porque tudo nos cansa ou incomoda.
Loucos porque não aproveitamos uma intempérie da nossa loucura para mudarmos tudo... e mesmo sem mudarmos nada... termos feito alguma coisa!
Não desperdicem a vossa loucura... com loucuras... tornemos esta década uma loucura explosiva de racionalidade e valores, de objetividade e criatividade... Bom 2020!